quarta-feira, 4 de novembro de 2020

S. JOÃO E OS TRIPEIROS


 




COISAS DE S. JOÃO









A FOGUEIRA E O FOGO DE ARTIFÍCIO
 
As fogueiras de S. João são ateadas nas ruas, por grupos de moradores e amigos que, saltando por cima delas, demonstram a sua coragem, e têm virtudes purificadoras, tendo em vista a saúde, o casamento e a felicidade.
À meia-noite do dia 23 de Junho há fogo de artifício, ou fogo de S. João, que é ainda uma das razões pelas quais o povo sai à rua. É em direcção à Ribeira que o povo se dirige, juntando-se milhares de pessoas em ambas as margens do rio Douro, para assistir ao maior espectáculo do ano, pleno de luz e cor. Os ritos ligados ao sol eram já celebrados pelos povos primitivos, que, através de magia imitativa, acendiam fogueiras “fogo do céu”, pois acreditavam trazer para a noite a potência diurna do sol, que, nesta altura do ano, começava já o seu percurso descendente, factor que preocupava os povos que dependiam dos ciclos naturais. Relacionados também com as manifestações ligadas ao fogo são os tradicionais balões de S. João, feitos em papel e em cores variadas, que, na noite, são cuidadosamente lançados em direcção ao céu, proporcionando um espectáculo ímpar de centenas de pontos de luz.
 
 
 
A ÁGUA E AS ORVALHADAS
 
Além de trazer consigo apologias ao culto e a rituais pagãos, a água tem particular função nesta festa enquanto elemento da cena bíblica do Baptismo, protagonizada por João e Jesus. Na sabedoria popular a água dorme todas as noites, excepto na noite de S. João. Na noite e madrugada de S. João, a água das orvalhadas é benta e tem o poder de curar doenças e dar beleza aos jovens e favorecer amores, entre outros benefícios. Em tempos, houve mesmo na Alameda das Fontainhas, uma fonte para onde o povo se deslocava na noite de 23 de Junho, entre a meia-noite e o nascer do Sol, para beber a água ou lavar-se nela. As orvalhadas são sentidas nesta noite de uma forma mais acentuada e já fazem parte do ritual da própria festa. Presentemente, a noite de S. João termina na Foz do Douro, com o povo a rumar em direcção ao mar até ao nascer do dia.
 
 

O ALHO-PORRO E O MANJERICO
 
As ervas aromáticas, próprias desta altura do ano, assumem nesta festa particular importância, tanto pelos benefícios que se julga trazerem à saúde, como pelas manifestações que o povo lhes atribuiu, tornando-as um símbolo do S. João. Também chamadas “ervas de S. João”, têm virtudes mágicas e terapêuticas, como resquícios de complexos rituais de culto romanas e célticas. É o caso do alho-porro, ou “alho de S. João”, que se tornou o símbolo por excelência das Festas de S. João do Porto, e que é usado democraticamente na noite mais longa do ano para tocar e dar a cheirar a quem por nós passa, em desejo de boa sorte e fortuna. Os manjericos são o tipo de erva aromática mais popular nesta festa, habitualmente comprados em qualquer rua da baixa da cidade, quer para decoração, quer para oferta. São vendidos em vasos enfeitados com uma bandeirola, presa por um arame, com uma quadra popular alusiva à Festa, ao Santo e às intenções mais lascivas do povo. Devem ser “cheirados” com a mão.
 
 
 
O MARTELINHO DE S. JOÃO
 
Na baixa da cidade, nas bancas onde se apregoa a venda dos tradicionais manjericos, cravos, erva-cidreira, ”alho-porro”, reparte-se agora o espaço com os modernos martelinhos, elementos em plástico que produzem um som próprio desta Festa, embora a finalidade do seu inventor, tenha sido uma forma de criar mais alegrar na queima das fitas na cidade. Logo a ideia foi aproveitada pelo povo para as imprescindíveis, mas amistosas “agressões” entre os foliões da noite de S. João. Criado com o propósito de diversão é o instrumento vital da festa, produzindo sons animados que contagiam desde o início do dia quem está na cidade, anunciando a diversão mais tardia. Coloridos, de formas e tamanhos diferentes, são escolhidos conforme a energia do folião. Servem para “bater” nas cabeças dos passantes, sem que essa demonstração provoque qualquer incómodo, apenas riso.
 
 
 
 
A CASCATA
 
São cenários livres de representações, com origem provável nos presépios de Natal, talvez pela perfeita simetria entre as festas solsticiais. A água, elemento imprescindível das cascatas sanjoaninas, que provavelmente terá dado origem ao seu nome, e a imagem de S. João Baptista baptizando Jesus são os elementos centrais do conjunto, cujo cuidado na sua construção nos mostra a particular devoção dos portuenses ao Santo. Na composição das cascatas surgem verdadeiras aldeias com construções de casas minúsculas e caminhos traçados de areia e musgos, que são a reconstituição de lugares da cidade e costumes de outros tempos. As figuras de barro pintadas de cores vivas, de nome mascates, são verdadeiras obras de arte popular criadas pelos mascateiros, que representam as pessoas no seu quotidiano, laborando nas suas profissões, muitas delas já desaparecidas, e animais que nos dias de hoje já não se vêem nas cidades. As cascatas, únicas em Portugal e no mundo, são muito coloridas, algumas mesmo animadas através do movimento das peças e muito enfeitadas, quer pelo colorido das luzes, quer pelas folhagens e verduras utilizadas, elementos que, no seu conjunto, dão origem a várias interpretações e que personificam a vivência desta festa pelo povo. Variam de tamanho e não obedecem a nenhum modelo de concepção, surgindo consoante a imaginação de quem as ergue com paixão em qualquer recanto, sejam grupos de pessoas que se organizam para mostrar a sua criatividade, sejam crianças, que, com as suas modestas cascatas, organizam um peditório para o Santo. Pela sua autenticidade são sujeitas a um concurso anual, no qual é eleita a mais bela e tradicional, premiando desta forma a persistência dos portuenses neste velho hábito. As mais conhecidas e tradicionais e que ainda subsistem, são a da Alameda das Fontaínhas, local de romaria e oração, e a cascata frente aos Paços do Concelho, de iniciativa da Câmara Municipal, tributo à Festa da Cidade.
 
 
 
A GASTRONOMIA
 
Na noite da Festa ou no dia de S. João come-se caldo verde com broa, carneiro, anho ou sardinha assada, salada de pimentos e, para sobremesa, leite-creme. Na madrugada do dia 23 de Junho bebe-se café com leite e come-se pão com manteiga. As origens desta tradição são pouco precisas. Há quem diga que o uso do anho ou cabrito se deve à presença deste animal nas imagens de S. João, numa alusão ao cordeiro de Deus, e que a sardinha foi introduzida mais tarde por ser mais barata e muito abundante nesta altura do ano. Como diz o ditado popular, “No S. João, pinga a sardinha no pão”.
Recuperada a tradição do bolo de S. João, cuja receita oficial leva farinha, fermento, frutas cristalizadas, nozes, amêndoas, licor, rum, cognac a gosto e leite para amassar, este torna-se uma iguaria se acompanhado pelo famoso néctar dos Deuses – o Vinho do Porto.
 
 
 

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