8º CAPITULO
Quando
chegou a domingo, lá estávamos todos, elas de calças de treino e camisolas
cor-de-rosa estampadas com o logo da LPCC. Eu e o Joel, ficamos no apoio
logístico, sentados na esplanada do “Orfeu” a fazer horas. Afinal, tínhamos
resolvido almoçar fora e o “Flor do Ave” esperava por nós para um leitãozinho à
moda da Bairrada.
Depois
da caminhada, chegamos a casa para os banhos. Como há dois banheiros em casa, a
Clarinha ocupou um e a Nádia outro. A Lara foi levar toalhas às duas, mas
quando entregou à Nádia, fez uma descoberta tão importante mas que resolveu
deixar para à noite me contar.
Saímos,
já eram 14 horas rumo à Trofa para almoçar o famoso Leitão à Bairrada. A Nádia
nunca tinha provado e adorou. De tarde, aproveitamos para dar um passeio por
Vila do Conde e Póvoa. Ao fim da tarde, eram 19 horas, regressamos a Ermesinde,
mas não fomos para casa, confesso que andava desejoso de mostrar à Nádia e
mesmo à Clarinha, um bom momento de fado. Fomos ao restaurante Regional que aos
domingos, há hora de jantar, havia fado. O Manuel Barbosa recebeu-nos
entusiasticamente, pois ultimamente tem sido rara a nossa presença.
A
Nádia ficou encantada com o acolhimento dos presentes á minha pessoa, e mais
ainda, quando muitos cantaram fados de minha autoria.
—
Ó Avô não o fazia tão famoso nestas andanças. Parece mesmo que vou ficar fã
desta melodiosa canção, poemas bonitos e profundos, mas a guitarra… Adorei
ouvir.
—
Sabes Nádia, o fado é genuinamente português, tanto que foi consagrado como
Património da Humanidade em 2011. Agora está globalizado, ultrapassou as
fronteiras e já ganhou mesmo prémios na World Music. Havia em Luanda algumas
casas de fado como o “Muxima”, o “Támar” e outras, que calculo já não devem
existir.
Agora,
há uma coisa que deves saber. O Fado aprendesse a ouvir nestas casas, não pelos
CD’s… Aqui, todo o ambiente a “ele” inerente, desde a vela sobre na mesa, os
petiscos, o vinho e até as toalhas aos quadradinhos, fazem parte juntamente com
o silêncio, o xaile das cantadeiras e o sentimento que se põe tanto a cantar,
como a ouvir o fadista de olhos fechados, que dá tudo de si á alma do fado, com
os requebros que faz na garganta, com seu modo de sentir o que diz o poema. Tudo
isto é o ritual do fado. Por isso o fado nunca é igual duas vezes, tão
diferente do CD que capta aquele momento “só” e não ouves mais o seu estilo
diferente como muitas das vezes acontece.
—
Muito bem Sr. Marcelo — Disse a Clarinha — Se tivesse tido esta explicação
antes, teria gostado muito mais do fado. Joel, tens que me trazer mais vezes,
adorei tudo isto.
Fadistas presentes como o Zé Ferreira, Rosita e Nelson Duarte vieram-nos cumprimentar. Apresentei-lhes a minha (nova) neta, mas creio que não compreenderam muito bem o que se passava, paciência…
A
noite foi muito agradável, o Joel e a Clarinha foram levar a Nádia a casa,
depois de nos deixar a nós. Como a Lara estava ansiosa por me contar a sua
descoberta, foi directa ao assunto:
—
Sabes aquela mancha, a flor que tenho nas costas?
—
Sim. Que tem? Já tens isso de nascença.
—
De nascença, dizes bem! Agora repara, como pode a Nádia ter uma igual e no
mesmo sítio que eu tenho? Se ela não me pertence… O Dário e o Joel têm, mas isso
compreende-se…
—
De facto é curioso… Podia a minha filha, a mãe dela ter… Mas… Não sou eu que
tenho! Está aqui um caso interessante para o nosso amigo Dr. Cardoso, nos
explicar. Amanhã ligo-lhe para marcar uma conversa com ele. Agora vamos dormir.
O
Dr. Cardoso, amigo de muitos anos, esclareceu-nos sobre a famosa mancha que
minha mulher tem nas costas e que nosso filho e neto também possuem.
Segundo
ele, as marcas de nascença são comuns em recém-nascidos, e podem ir
desaparecendo com o tempo ou permanecer pela vida toda. A maioria das marcas de
nascença classifica-se como vascular ou pigmentar. As manchas vasculares são
causadas pelo acúmulo de vasos sanguíneos sob a superfície da pele. Variam de
cor-de-rosa e salmão a vermelho e arroxeado, dependendo da profundidade dos
vasos. As manchas pigmentares (como é o caso) normalmente castanhas claras,
cinzas, azuladas ou pretas, são resultado do desenvolvimento anormal de células
da pigmentação. Claro que podem ser, e na maioria dos casos são, hereditárias.
Agora, também pode haver coincidências, mas mancha igual e no mesmo local… essa
pessoa tem que ser familiar da Lara.
Para
os italianos, marcas de nascença são conhecidos como “vogile”, o que significa
desejos. É por isso que a maioria das histórias sobre as manchas, estão
associados aos desejos insatisfeitos da mãe durante a gravidez. Não sei se a
mãe da Lara tinha, mas pode já vir daí.
Contamos
então ao Cardoso, que este caso tinha a ver com o aparecimento da nossa nova
neta. Intrigado com o assunto, teve um raciocínio imediato com uma pergunta:
—
O vosso filho esteve em Angola na mesma data?
O
Chão rui-me debaixo dos pés. Em Setembro de 1992 e a Nádia nasceu em 13 Maio de
1993. Meu Deus! Mais uma vez o destino a pregar-nos partidas… A ser verdade…
Não… Não pode ser…
—
Cardoso á maneira de… através do ADN saber a certeza com 100% certo? É fiável
99%, basta trazeres por exemplo: a escova de dentes, ou cabelo (com raiz) dos
dois, em alguns dias dou-te o resultado, para teres mesmo a certeza.
Saímos
arrasados da casa do Cardoso. A Lara dizia:
—
Mesmo a ser verdade, não podemos culpar ninguém. Se fosse a haver culpados,
eras tu o único.
—
Tens razão Lara… Mas entre tantas mulheres, ele vai encontrar a própria irmã? É
quase impossível de acreditar… É um incesto inconsciente, nem um nem outro
sabiam…
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