quinta-feira, 8 de outubro de 2020

MAIANGA "NOVELA" 8


8º CAPITULO

 

 

Quando chegou a domingo, lá estávamos todos, elas de calças de treino e camisolas cor-de-rosa estampadas com o logo da LPCC. Eu e o Joel, ficamos no apoio logístico, sentados na esplanada do “Orfeu” a fazer horas. Afinal, tínhamos resolvido almoçar fora e o “Flor do Ave” esperava por nós para um leitãozinho à moda da Bairrada.

Depois da caminhada, chegamos a casa para os banhos. Como há dois banheiros em casa, a Clarinha ocupou um e a Nádia outro. A Lara foi levar toalhas às duas, mas quando entregou à Nádia, fez uma descoberta tão importante mas que resolveu deixar para à noite me contar.

Saímos, já eram 14 horas rumo à Trofa para almoçar o famoso Leitão à Bairrada. A Nádia nunca tinha provado e adorou. De tarde, aproveitamos para dar um passeio por Vila do Conde e Póvoa. Ao fim da tarde, eram 19 horas, regressamos a Ermesinde, mas não fomos para casa, confesso que andava desejoso de mostrar à Nádia e mesmo à Clarinha, um bom momento de fado. Fomos ao restaurante Regional que aos domingos, há hora de jantar, havia fado. O Manuel Barbosa recebeu-nos entusiasticamente, pois ultimamente tem sido rara a nossa presença.

A Nádia ficou encantada com o acolhimento dos presentes á minha pessoa, e mais ainda, quando muitos cantaram fados de minha autoria.

— Ó Avô não o fazia tão famoso nestas andanças. Parece mesmo que vou ficar fã desta melodiosa canção, poemas bonitos e profundos, mas a guitarra… Adorei ouvir.

— Sabes Nádia, o fado é genuinamente português, tanto que foi consagrado como Património da Humanidade em 2011. Agora está globalizado, ultrapassou as fronteiras e já ganhou mesmo prémios na World Music. Havia em Luanda algumas casas de fado como o “Muxima”, o “Támar” e outras, que calculo já não devem existir.

Agora, há uma coisa que deves saber. O Fado aprendesse a ouvir nestas casas, não pelos CD’s… Aqui, todo o ambiente a “ele” inerente, desde a vela sobre na mesa, os petiscos, o vinho e até as toalhas aos quadradinhos, fazem parte juntamente com o silêncio, o xaile das cantadeiras e o sentimento que se põe tanto a cantar, como a ouvir o fadista de olhos fechados, que dá tudo de si á alma do fado, com os requebros que faz na garganta, com seu modo de sentir o que diz o poema. Tudo isto é o ritual do fado. Por isso o fado nunca é igual duas vezes, tão diferente do CD que capta aquele momento “só” e não ouves mais o seu estilo diferente como muitas das vezes acontece.

— Muito bem Sr. Marcelo — Disse a Clarinha — Se tivesse tido esta explicação antes, teria gostado muito mais do fado. Joel, tens que me trazer mais vezes, adorei tudo isto.

Fadistas presentes como o Zé Ferreira, Rosita e Nelson Duarte vieram-nos cumprimentar. Apresentei-lhes a minha (nova) neta, mas creio que não compreenderam muito bem o que se passava, paciência…   

A noite foi muito agradável, o Joel e a Clarinha foram levar a Nádia a casa, depois de nos deixar a nós. Como a Lara estava ansiosa por me contar a sua descoberta, foi directa ao assunto:

— Sabes aquela mancha, a flor que tenho nas costas?

— Sim. Que tem? Já tens isso de nascença.

— De nascença, dizes bem! Agora repara, como pode a Nádia ter uma igual e no mesmo sítio que eu tenho? Se ela não me pertence… O Dário e o Joel têm, mas isso compreende-se…

— De facto é curioso… Podia a minha filha, a mãe dela ter… Mas… Não sou eu que tenho! Está aqui um caso interessante para o nosso amigo Dr. Cardoso, nos explicar. Amanhã ligo-lhe para marcar uma conversa com ele. Agora vamos dormir.

O Dr. Cardoso, amigo de muitos anos, esclareceu-nos sobre a famosa mancha que minha mulher tem nas costas e que nosso filho e neto também possuem.

Segundo ele, as marcas de nascença são comuns em recém-nascidos, e podem ir desaparecendo com o tempo ou permanecer pela vida toda. A maioria das marcas de nascença classifica-se como vascular ou pigmentar. As manchas vasculares são causadas pelo acúmulo de vasos sanguíneos sob a superfície da pele. Variam de cor-de-rosa e salmão a vermelho e arroxeado, dependendo da profundidade dos vasos. As manchas pigmentares (como é o caso) normalmente castanhas claras, cinzas, azuladas ou pretas, são resultado do desenvolvimento anormal de células da pigmentação. Claro que podem ser, e na maioria dos casos são, hereditárias. Agora, também pode haver coincidências, mas mancha igual e no mesmo local… essa pessoa tem que ser familiar da Lara. 

Para os italianos, marcas de nascença são conhecidos como “vogile”, o que significa desejos. É por isso que a maioria das histórias sobre as manchas, estão associados aos desejos insatisfeitos da mãe durante a gravidez. Não sei se a mãe da Lara tinha, mas pode já vir daí.

Contamos então ao Cardoso, que este caso tinha a ver com o aparecimento da nossa nova neta. Intrigado com o assunto, teve um raciocínio imediato com uma pergunta:

— O vosso filho esteve em Angola na mesma data?

O Chão rui-me debaixo dos pés. Em Setembro de 1992 e a Nádia nasceu em 13 Maio de 1993. Meu Deus! Mais uma vez o destino a pregar-nos partidas… A ser verdade… Não… Não pode ser…

— Cardoso á maneira de… através do ADN saber a certeza com 100% certo? É fiável 99%, basta trazeres por exemplo: a escova de dentes, ou cabelo (com raiz) dos dois, em alguns dias dou-te o resultado, para teres mesmo a certeza.

Saímos arrasados da casa do Cardoso. A Lara dizia:

— Mesmo a ser verdade, não podemos culpar ninguém. Se fosse a haver culpados, eras tu o único.

— Tens razão Lara… Mas entre tantas mulheres, ele vai encontrar a própria irmã? É quase impossível de acreditar… É um incesto inconsciente, nem um nem outro sabiam…

 

 

 

 


Sem comentários:

Enviar um comentário

ENQUANTO ME LEMBRO...